sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

ESTAÇÃO DE ARARAQUARA: INTERVENÇÃO DESASTROSA






















Amigos,

Recebi mensagem do amigo Alex Melman que denuncia a "re(de)forma" da estação de trem local.
A sociedade precisa ficar atenta para "vândalos" travestidos de técnicos que acabam intervindo de forma alienigena e destróem um patrimônio cultura e histórico preservado a duras penas!!
Pergunta-se: quem autorizou esses Senhores a fazer isso?
A comunidade local foi consultada?´
Para um país que se diz: democrático, falta ainda muito diálogo.
Denunciem.
Repassem essa informação adiante.

Escrevam para

prefeituradeararaquara@araraquara.sp.gov.br

RESTAURO OU VANDALISMO?

AMIGOS,

TRANSCREVO TEXTO QUE REVELA A INDIGNAÇÃO DAQUELES QUE SE SENTEM DESRESPEITADOS, E AGREDIDOS POR POLÍTICAS ALIENÍGENAS DE INTERVENÇÃO DESASTROSA NA ARQUITETURA HISTÓRICA DA ESTAÇÃO DE TREM DE ARARAQUARA.
LEIA O TEXTO DE IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO, ENVIADO POR ALEX MELMAN.
VAMOS NOS UNIR PARA QUE ESSE DESCALABRO CESSE E POSSAMOS SALVAR O QUE AINDA RESTA DE NOSSO PATRIMÔNIO HISTÓRICO FERROVIÁRIO.

ABRAÇOS

SAULO

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Restauro ou vandalismo?

IGNACIO DE LOYOLA BRANDÃO

Dois e-mails assustadores num prazo de 24 horas. Ambos sobre destruição.
Um deles trouxe o assassinato de milhares de baleias na Dinamarca, numa
cerimônia que marca a passagem dos jovens à idade adulta. O mundo
inteiro deveria protestar, clamar pelo espetáculo dantesco (finalmente uso
esta palavra) de sangue e morte. Ao ver as fotos, não há quem não sinta
ânsias, tontura, mal-estar, repulsa.
Tive as mesmas sensações ao contemplar as fotos da reforma da estação
ferroviária de Araraquara que estão circulando em rede, em cadeia pela
Internet e de computador para computador. Estou neste momento
reenviando para dezenas de amigos e também ao Patrimônio Histórico. Não
é reforma, é demolição. Não é restauro, é vandalismo. Não é conservação, é
arraso. É estrago, aniquilação, dilaceração, extinção, devastação. É
deformação, destroçamento, arraso, violentação.
Falam todos de devastação das matas. E a devastação da memória, do
patrimônio, da cultura? E o extirpamento de nosso passado? Quem
executou o projeto será de Araraquara? Terá sido um dos arquitetos que a
prefeitura têm como contratados? Quem projetou tal ignomínia conhece a
história da cidade, viveu-a, presenciou, consultou a comunidade? Uma
“reforma” de tal monta tem de passar pelo crivo da comunidade. O projeto
tem de ser discutido, debatido, conversado, como é de uso em países
civilizados. Araraquara é uma cidade civilizada, ainda que o poder público,
nela, ao longo da história, nem sempre se comporte como tal. Aliás,
comporta-se ao contrário.
Temos exemplos ao longo de décadas, exemplos que foram condenados, e
que, mesmo assim, não serviram para mudar o rumo das coisas. Cito uns
poucos, entre os mais execrados pelo futuro. A derrubada da Matriz de São
Bento pelo padre Orlando Garcia da Silveira na década de 50, a demolição
do Teatro Municipal pelo prefeito Rômulo Lupo. O sumiço do Clube 27 de
Outubro, na Rua 2. Houve também o Clube 22 de Agosto, mas sei que
neste caso foi diferente, aconteceu, ao que eu saiba, um desmoronamento
pela má conservação. Ou não? Nunca se sabe. Mas o poder público
poderia/deveria ter investido ali, era parte da história dos italianos que
construíram a cidade. São cicatrizes que não desaparecem da história
arquitetônica da cidade. E quando demoliram o Café It, na Rua 3, por que
não retiraram primeiro o painel de Domenico Lazzarini, de grande valor
estético? Para não falar das casas que poderiam ter sido conservadas como
a do Chiquinho Vaz, na esquina da Rua 4 com a Duque de Caxias, a do
antigo cabaré Majestic, na Rua 8, a da Rua 4 que abrigou por um tempo a
biblioteca municipal. E a marquise da Casa Barbieri ali na Rua 2?
Progresso? Há tanto terreno na cidade para o progresso.
A estação doeu, feriu fundo. O autor do projeto é da cidade? Como se entra
impunemente num edifício que tem toda uma história de profundo
envolvimento com as tradições, com a evolução de Araraquara, com a
nossa formação, e se faz o que se quer, se manda e desmanda? O autor do
projeto e quem o autorizou sabem o que significaram a Estrada de Ferro
Araraquarense e a Companhia Paulista de Estradas de Ferro? Ou são jovens
demais, nunca andaram de trem, nunca embarcaram ou desembarcaram
aqui, nunca viram o movimento e o significado da estação para a cultura e a
economia?
A estação tem a ver com nossas raízes, nossos antepassados, pais, tios,
avós, bisavó, tataravós, com gerações e gerações. A estação está na alma e
no coração de milhares de pessoas, araraquarenses ou não. E qual é o
movimento que se esboça na cidade para interditar a obra em nome da
decência, da preservação da memória? O Patrimônio Histórico se
manifestou? Ainda há tempo de embargar e mandar refazer? Meus amigos,
aquela escada de ferro no hall de entrada é um acinte. Talvez o autor do
projeto (quem é?) tenha se imaginado como o arquiteto que construiu a
pirâmide em frente ao Louvre, em Paris. O modernismo dentro do passado.
Mas, minha gente, veja a diferença entre o talento e a visão de um e a do
outro, esse nosso (será nosso?).
Estou na luta. Dentro de um mês, Marcelo Barbieri assume o cargo. O que
ele pode fazer? O que dá tempo de fazer? O pai de Marcelo foi um dos
expoentes da arquitetura em Araraquara, um dos que a ajudaram a
modernizar sem destruir. Faça em homenagem ao Nelson, meu caro
Marcelo. Faça em respeito aos araraquarenses. Segure a memória, restaure
o passado, mantenha-o vivo e não estilhaçado.
Artigo publicado no jornal “Tribuna Impressa”, de 03/12/2008

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Repórter Record denuncia "a morte do transporte ferroviário no Brasil"

Repórter Record denuncia o descaso das autoridades brasileiras com o transporte ferroviário no Brasil e a sua decadência total!!

Vale a pena ver esse vídeo que contextualiza bem a respeito desse descaso.

VEJA O VÍDEO

Estação Vida





Amigos,

Peço permissão para reproduzir mensagem trocada com o jornalista: Reinaldo Oliveira que também conviveu com a cultura ferroviária e nos apresenta uma peça que se constrói a partir de uma metáfora entre a vida e o trem.



Se me consente, Reinaldo, Amigo, transcrevo sua amável mensagem:

Alô professor Saulo

Paz e bem!

Agradeço o contato e digo que nasci na região da Alta Paulista e vi a chegada do trem em minha cidade (Irapuru/SP) e vivi parte da minha infância ali. Em 1966 ainda criança vim para Jundiaí. Porém de 2000 até janeiro de 2007 voltei para região da Alta Paulista - cidade de Flórida Paulista (região de Bauru, Marília, Dracena, Panorama, etc.). Atualmente moro em Jundiaí. Sou jornalista e lá chegando em 2000 imediatamente comecei a trabalhar em jornais da região. Lá ainda é uma boa região para morar, mas...., a tristeza é ver como a falta de ação governamental e do próprio povo, deixou bens tão preciosos (como as estações, vilas operárias em seu entorno, máquinas, vagões etc.) se acabarem. E o pior: a nova geração além de não conhecer estes bens, são completamente desligadas e ignorantes sobre àquelas belezas. Atualmente faço trabalho voluntário na área de jornalismo e tbem faço parte da Cia Nascem de Teatro, onde desde de junho estamos encenando a peça 'Estação Vida', que tem relação com trens, estação, etc. Só atuam ator/atriz acima dos 45 e a mais velha tem 84. Mas a diversão, lembranças do bons tempos, boas gargalhadas, bem como momentos de reflexão, são garantidos. Fizemos a estréia da peça no dia 29 de junho, no teatro Glória Rocha - em Jundiaí, e dia 29 de setembro fizemos nova apresentação no mesmo local. As duas paresentações com lotação esgotada. Peço permissão e envio o cartaz de divulgação da peça, bem como algumas fotos do espetáculo, com autorização para postagem nos seu blog, se considerar pertinente. Ah! Visitei o blog e parabéns, incentivo a que continue e, suceeeessooo!!

Abraço fraterno




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From: saulocesar@uol.com.br
To: reioliveirao@hotmail.com
Subject: Convte
Date: Wed, 15 Oct 2008 15:47:48 -0200



Primeiramente, quero parabenizá-lo pelo texto:

'O trem passou e a gente ficou'

Esse documentário é muito importante e vem se somar a uma luta sobre a memória e identidade de um país!

Aproveito a oportunidade para convidá-lo a conhecer o meu blog: caminhos de ferro, no qual procuro promover uma relfexão a respeito das ferrovias e sua extinção em todo o território nacional.
Lá também será possível conhecer o Projeto: Música sobre trilhos, que tem o objetivo de resgatar a memória ferroviária no imaginário coletivo.

Será um prazer ter a sua visita.

Um abraço

Prof. Saulo César da Silva

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Menina de trem





Fátima Venutti


Aquela manhã de sexta-feira mostrava-se difícil de ser digerida. Enquanto do lado de fora o velho São Pedro fazia faxina no céu jogando baldes e baldes de água, eu estava totalmente estático, olhando pra tela do computador, com uma coluna pra ser entregue até o final daquela mesma manhã. Detalhe: sem idéia nenhuma do que iria escrever (como todo colunista que se preze).

Já havia entornado uma garrafa de café e acabava de acender o último cigarro do maço (já pensando que não poderia sair para comprar outro e iria curtir aquele vagarosamente). Olhei para o relógio: 10hs25min. Eu tinha exatos 35 minutos para desenvolver um texto de duas laudas e enviar por e-mail ao jornal. Onde havia deixado a minha inspiração?

Esmaguei pensativo o cigarro no cinzeiro e busquei instintivamente com o olhar um vulto que acabara de passar pelo lado de fora da janela e, num impulso, arremessei a cadeira para trás e fui conferir. Nada havia a não ser um tímido desejo de o sol aparecer para secar a água sobre o asfalto e aquecer um pouco mais aquela gélida manhã.

Voltei-me para o computador e num repente avistei aquela menina parada timidamente, recostada ao corte da parede de acesso à cozinha e a sorrir para mim.
- Que susto, menina! O que está fazendo aqui? Como entrou? Quem é você?

Meu coração, em disparada desordenada parecia que queria caminhar do peito à boca, sem escala. A menina, somente sorria. Vestido florido rosa, cabelos de um tom caramelo adornados com duas tranças; meias brancas e sapato de verniz preto. Por um instante, fechei os olhos e pensei: estou vendo coisas, deve ser muito trabalho, a pressão da crônica que não sai... Ao abri-los lentamente, lá estava ela, ainda. Desta vez, esticava os braços e me chamava para acompanhá-la. Irritado, levantei-me e com as mãos na cintura, feito alça de xícara, falei em tom mais intimidador:

- Olha aqui, eu não sei quem você é ou como entrou aqui. Tenho uma crônica pra entregar em 20 minutos senão perco meu emprego. Então, quer fazer o favor de ir embora?

Novamente e sem se ater ao meu nervosismo ela sorriu, porém, a passos contados, veio ao meu encontro, pegou em minha mão esquerda e num ato de condução, foi me puxando para acompanhá-la. Sem reação e para finalizar a situação, segui seus passos. De repente, senti tudo escurecer e uma forte pressão na cabeça. Desmaiei.

Havia fumaça por todos os lados, muita conversa em voz alta e um aroma que me era familiar. Aos poucos, a imagem foi se abrindo e pude tomar conta de onde estava. Uma mistura de prazer, dúvida e incompreensão tomaram conta de mim. Eu estava em uma estação de trem.

Era noite e uma enorme lua cheia reluzia no céu cravejado de estrelas. À minha frente, aquele enorme e majestoso vagão prateado com suas janelas quadradas e de meio vidro. A fumaça ia se apagando pelos trilhos e soltando o cheiro inconfundível de óleo queimado adentrando pela minha narina e sendo saboreado pela minha alma. Pensei: deve ser um sonho e assim vou aproveitá-lo nostalgicamente.

Comecei a caminhar, lentamente, hipnotizado pela oportunidade de sentir novamente o vento rasgando meu rosto, de ouvir o apito e de sentar-me nas poltronas desconfortáveis. Eu desejava fortemente entrar dentro dele. Quando percebi, aquela menina ainda segurava minha mão. Meu impulso foi de trancar as sobrancelhas, olhar bem pra ela e num solavanco, puxar minha mão presa à dela. Mas meu coração estava tão radiante por saborear aquele momento que a única atitude que consegui ter foi a de inflar o peito com ar e desenhar um largo sorriso em meu rosto, só para ela.

Ela correspondeu e, ainda segurando minhas mãos, conduziu-me à frente do trem. Enquanto passávamos pelos vagões, uma outra criança adormecida dentro de mim acordava. De olhos arregalados, buscava em cada imagem um pedaço das viagens que eu havia vivido. Quando me dei conta, eu estava frente a frente ao mais belo maquinário que o homem foi capaz de inventar: a locomotiva. A luz da lua colaborava, iluminando o limpa-trilhos e deixando à mostra toda a imponência do nariz daquela inesquecível peça. Pela minha face, as lágrimas iam saltando sem controle. Podia sentir minhas mãos sendo apertadas mais fortemente por aquela criança, feito uma frase de apoio e de certeza de que o que eu estava sentindo era mais forte do que eu mesmo. Ali, extasiado, embriagado e perdidamente sem compreensão alguma do que estava vivendo, senti o golpe fatal: o primeiro apito da partida.

Aquele som ecoou em minha mente recortando, feito um quebra-cabeça, todas as minhas memórias dos sons que eu guardava cuidadosamente. Ria, chorava, vibrava. De mãos dadas, a menina me conduziu a dar passos para trás, afinal, meu brinquedo de criança ia partir. A fumaça iniciava seu desenho por aquela noite, bailando por sobre a locomotiva e depois, sobre os vagões.

Passageiros apressavam-se em passar pela catraca de embarque, abriam-se janelas, outras se fechavam. Rostos apareciam pra fora buscando enxergar o comprimento do trem ou ainda avistar o amigo, o parente que ficara na plataforma. Novamente o trem apitou e desta vez, segundos bastaram para começar o seu bailado sobre os trilhos, deslizando lenta e deliciosamente. Ah, aquele som, aquele aroma, as luzes internas dos vagões passando em minha frente e o desejo enorme de estar dentro dele, sacolejando de um lado para o outro no corredor, esbarrando em um pé esquecido ou desviando do vendedor de chocolate quente. Ainda pude acompanhar com o olhar a visão do último vagão adentrando na escuridão da noite e a locomotiva surgir com seu clarão na curva, deslizando sob a luz da lua.

Novamente tomei um farto punhado de ar e levei aos pulmões, olhei para a menina que, estática, acompanhava cada sentimento que eu vivia. Levantei os olhos para a lua e os fechei, na intenção de jamais esquecer a visão da sua companhia naquela experiência.

Havia um cheiro forte de café fresco. Quando abri os olhos, debruçado estava sobre minha mesa. Lentamente fui levantando a cabeça e acordando daquele sonho. Fui até a cozinha, preenchi o vazio da xícara com aquele negro café e por segundos me perdi na fumaça do café que ainda escorria pelo coador. Olhei pela janela e o sol já assumia sua imponência rasgando o veio dos galhos das árvores e esquentando o asfalto. Do outro lado da rua, lá estava ela: a menina. Estática, sorria pra mim com uma felicidade contagiante. Retribui instintivamente, acenando. Foi quando me dei conta da crônica.

Joguei o resto de café na pia, larguei a xícara e fui correndo olhar o relógio na parede: eram 10h55min e eu tinha somente 5 minutos para mandar um texto que nem havia começado. Desesperadamente tomei posse do meu lugar e eis que quando olhei para a tela do computador, lá estava ela. Pronta, linda e perfeita. Só me restou acessar o e-mail e enviar.

(In Terceiro Apito, Fátima Venutti, Nova Letra, 2007, pág, 43)

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