quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Trens da memória

Antiga estrada de ferro Central do Brasil, na cidade de Prudente de Morais, Minas Gerais - Brasil.

Notícia boa é sempre bom compartilhar.


Gostaria de sugerir a leitura do texto abaixo, retirado do site:




Eu tenho uma dívida enorme com meu passado: nunca escrevi sobre trens. Logo eu, filho de funcionário de estrada de ferro que tinha com locomotivas, vagões, trilhos e dormentes uma relação de completa intimidade. Meu pai sabia os nomes das peças, das manobras, dos ramais, dos fabricantes. Conhecia cada quilômetro da linha da Central do Brasil de Belo Horizonte a Monte Azul, estação perdida na divisa com a Bahia. Ainda garoto, entre os dez e os quatorze anos, na década de 1970, pude acompanhá-lo em viagens ferroviárias de inspeção, realizadas no trecho entre General Carneiro e Corinto. Os trens são parte de minha vida, embora eu seja um passageiro eventual dos caminhos de ferro.

Antiga estrada de ferro Central do Brasil, na cidade de Prudente de Morais, Minas Gerais - Brasil.
A bem da verdade, meu primeiro trem foi também meu único trem. A família inteira foi a Belo Horizonte, de ônibus, e retornou de trem para Pedro Leopoldo. Embarcamos na Estação Central em vagão da primeira classe. Logo descobrimos o carro-restaurante e lá, entre guaranás e sanduíches de queijo e mortadela, fizemos a curta viagem. Filhos do engenheiro-residente tratados como príncipes pelo olhar prestativo e vigilante do chefe do trem. Locomotiva a diesel, veloz e possante. O barulho característico – tatac-tatac –, as paisagens sucedendo-se na janela: o rio das Velhas, Capitão Eduardo, Nova Granja, uma roça aqui, uma casinha branca lá… Com pouco mais de dez anos, pela janela do trem eu olhava Minas Gerais: capiaus, fazendas, vilarejos, morros, fumaça. Essa imagem infantil ainda é a imagem que guardo de Minas.
Depois vieram inúmeras viagens no carrinho-de-linha, um pequeno veículo usado para fazer a vistoria das condições da estrada e das obras ferroviárias. Dentro dele, viajavam Noni, o condutor do carro, meu pai, eu, meu irmão e mestres-de-linha responsáveis por trechos específicos da estrada. De vez em quando, um maquinista, agente de estação ou trabalhador da “conserva” pegava uma carona. Sacolejando, o carrinho-de-linha rasgava o cerrado. De tempos em tempos, paradas para refrigerantes, lombinhos, franguinhos e doces. A cozinha mineira é insuperável! Mas também havia longas esperas, nos desvios de estações perdidas no meio do mato, por causa dos trens de carga ou de passageiros que tinham prioridade na linha. Essas paradas só não eram exasperadoras quando ocorriam em Cordisburgo ou Silva Xavier, localidades míticas da geografia mineira guardada em meu espírito.

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